Julho 2022 Entrevista | Hotel da Vila, uma estadia para todos

Com o sonho de conciliar o Turismo e a Gestão na sua vida profissional, Beatriz Afonso Lopes, natural dos Açores e licenciada pela Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, viu no mestrado em Gestão e Hotelaria de Saúde e Bem-Estar da Escola Superior de Ciências Empresariais, um fio condutor que levou à origem do projeto Hotel da Vila.  

A IPStartUp falou com a concorrente para conhecer melhor as suas ambições face à ideia de negócio que irá apresentar no Poliempreende, na Fase Nacional.  

No que consiste o projeto? 

O meu projeto consiste num hotel inclusivo para um público mais sénior ou com mobilidade reduzida, tratando-se dum espaço agradável e acolhedor para qualquer pessoa alojada. 

O Hotel da Vila funcionaria da mesma forma que um hotel convencional, só que introduziria um meio de consciencialização pelo público que nem sempre consegue aproveitar estas experiências na sua totalidade. O foco seria mais em estadias de longa de duração e menos de curta duração e teríamos atividades pensadas para os nossos clientes que envolvessem também a participação na horta ou no jardim e que acabam por trazer lucro pois pode utilizar-se a matéria-prima no restaurante do hotel. 

Porquê nos Açores? 

Eu escolhi os Açores porque foi onde eu nasci e enquanto cá vivi, ou mesmo das vezes que venho visitar, reparei que há muito pouca oferta neste sentido. As pessoas idosas acabam por ter de ir para um lar porque não existe outra alternativa, mesmo que tenham ainda muitas capacidades e autonomia. Faz sentido fazê-lo aqui, em São Miguel, para dar respostas a alguma procura que eu senti que havia.  

Qual a origem deste projeto? 

Quando vinha para os Açores ia conversando com familiares ou amigos, e sentia sempre que a população idosa, que se encontrava maioritariamente em lares, tinha uma vida mais controlada e com horários mais restritos. Uma vez até fui visitar uma amiga de família a um lar e pensei no quão estranho era ver todos deitados às seis e meia da tarde, enquanto havia pessoas ainda com capacidades para jantar a essa hora ou mais tarde.  

Depois, outra questão que me preocupou foi saber que os meus avós vão envelhecendo e que eu vou acompanhando o envelhecer deles e eles têm a possibilidade de estar em sua casa com ótimas condições, mas isso não acontece tão frequentemente e em todos os casos. Comecei a pensar num conceito de hotel que funcionasse como um lar que permitisse a autonomia individual das pessoas, mas também o acompanhamento.  

Como é que o projeto se diferencia perante a oferta de hotelaria existente? 

Diferencia-se porque, em termos do que há em hotelaria, vemos sempre o mais comum de oferta. Ou seja, os hotéis têm escadas, têm elevadores, têm um ou dois quartos adaptados para pessoas com alguma deficiência motora e pouco mais.  

O Hotel do meu projeto teria todos os espaços e todos os quartos adaptados a pessoas com mobilidade reduzida. É algo pensado não só para idosos, mas também para qualquer faixa etária. Existe uma grande diferença entre teres de reservar um quarto em específico, que tem de estar adaptado, ou em saberes que qualquer quarto se encontra pronto para te receber. As pessoas sentem-se bem porque estão num espaço que lhes permite estarem mais próximas dos quartos de hotel convencional. Tudo seria feito de forma subtil. 

Para além desta questão, é um hotel que permite estadias de maior duração. As pessoas podem ficar três meses, seis meses, podem ficar temporadas lá, com garantias de que é um sítio seguro, que permite acompanhamento face às necessidades de cada um, especialmente as pessoas idosas que têm outros tipos de necessidades. Quero, também, pensar num sistema de gestão que cria perfis de cada pessoa, das suas necessidades e que seriam monitorizados de acordo com uma pulseira estilo fit-bit, para controlar o batimento cardíaco e o nível de oxigénio, trazendo mais segurança a cada cliente.  

É diferenciador também na formação de todos os colaboradores, procurando capacitá-los para estarem aptos a lidar com diversas situações, mas também com o meu segmento de clientes.  

Quem identificas como o teu público-alvo? 

Essencialmente, pessoas idosas que têm ainda uma autonomia considerável e, também, qualquer faixa etária que tenha dificuldades reduzidas de mobilidade. Um jovem de 27 anos, mas em cadeira de rodas, pode facilmente vir para este hotel porque teríamos parcerias que fazem atividades turísticas para esse público-alvo, como passeios adaptados a clientes de mobilidade reduzida. 

O nosso segmento de clientes não é só o sénior, mas qualquer faixa etária que tenha dificuldades motoras. 

Como pretendes viabilizar um projeto segmentado e sustentável? 

A minha ideia é ver o que já existe nesse nível, não só em termos de concorrência, mas em termos de inovação também. Quero estar atenta a essas inovações que vão aparecendo, pois é um tema cada vez mais discutido e falado. Outras estratégias que quero adotar passam por atividades como a compostagem, que acaba por reduzir o desperdício e ter um impacto na pegada ecológica.  

Como descreves a passagem pelo concurso do Poliempreende? 

Foi uma experiência muito interessante. Passar de ser só uma ideia para um projeto foi algo que o concurso me ajudou bastante.  Apesar de estar a utilizar esta ideia como projeto final de mestrado, quando comecei no Poliempreende, ainda era só uma ideia muito geral e o concurso acabou por fazer com que tivesse de tomar decisões e realmente planificar e pensar no meu projeto.  

Algo muito interessante de perceber, ainda que de forma um pouco superficial, foi este processo todo de empreendedorismo. Não é só ter uma ideia, mas há um conjunto de pontos nos quais temos de refletir, desde a concorrência, benchmarking, preço e muitas outras. 

Por outro lado, foi exigente e nem sempre foi fácil conseguir conciliar com a vida profissional e pessoal, porque estava a trabalhar enquanto me encontrava a fazer o projeto final de mestrado e conciliava com a minha participação no Poliempreende, sendo que ainda é um concurso exigente.  

Ainda assim valeu muito a pena e trouxe-me muitas competências que eu sinto que são benéficas quer a nível pessoal quer a nível profissional, e também para o meu futuro. 

Qual a sensação de ter ganho o 1º Prémio do concurso? 

É muito boa. Quando me inscrevi no concurso, não esperava que tal fosse acontecer. Pensei que seria uma oportunidade muito boa para desenvolver competências e não pensei que fosse ser vencedora da fase regional. No entanto, sinto-me feliz por representar o Politécnico de Setúbal na final nacional e levar um projeto que acredito a tantos.  

Como pretendes gerir esse prémio? 

O facto de o meu projeto ter uma dimensão grande, implica muito para a concretização do mesmo. Por isso, ainda não decidi muito bem como irei gerir o prémio. Tenho um caminho muito longo a percorrer. No entanto, uma opção passa por aplicá-lo num projeto piloto, como uma versão mais pequena do hotel em alojamento local.  

Que expectativas levas para a Final Nacional? 

Vai ser igualmente interessante, mas mais desafiante. Vai ser muito bom ver as apresentações dos meus colegas do resto do país, mas também aprender com as críticas dos júris à minha apresentação e às restantes. Considero que é uma oportunidade de enriquecer o meu conhecimento.  

Vou dar o meu melhor e apresentar um projeto do qual eu acredito, por aí já é muito bom. Gostava de ficar numa boa posição, mas acho que a experiência vai muito mais além disso. 

Que reflexão fazes perante o percurso atual do Hotel da Vila? 

No geral, sinto que passou rapidamente duma ideia, quase de conversa de café, para um projeto. Era algo que eu sempre imaginara como um sonho, algo muito vago e sem “pernas para andar”. Agora, uma ideia já apresentada a um painel de júris, que vai ser novamente apresentada a outro painel de júris e com grandes hipóteses de se concretizar, faz-me pensar que estou num bom caminho para que seja uma coisa real.  

Do ponto visto pessoal, como é conciliar o mundo académico com o mundo empreendedor? 

O concelho que posso dar é para que as pessoas não desistam. Ao longo deste percurso, pensei que não ia conseguir e que estava a ser demasiado, mas as pessoas têm que ter a resiliência e continuar a lutar pelos seus sonhos. É possível aprender muito com este concurso. Não é fácil conciliar tudo, mas aprende-se imenso.